A amizade italiana que resistiu ao tempo: Giorgio e Olivio, vizinhos por décadas

A amizade italiana que resistiu ao tempo: Giorgio e Olivio, vizinhos por décadas

− Porca miseria!

− Porco cane!

É a velha camaradagem italiana, origem comum, de dois antigos amigos e vizinhos que mais uma vez se encontram pela manhã ipiranguista: Giorgio Balaré, 85, e Olivio Oltramari, 90. Moram há muitas décadas na mesma calçada, em sobrados simpáticos na rua Lino Coutinho, onde constituíram família.

Giorgio, a calva proeminente, magro, segreda ao ouvido a boa sacanagem dos italianos, dita sorrindo, arregalando os olhos e se ajeitando sobre a bengala que o ampara:

− Cazzo in culo no fa figliolo. Fa dolore, ma fa piacere.

Seu Olivio, hoje viúvo, carapinha branca, corpulento, está sentado num degrau da pequena escada da entrada de casa, feito menino.

Giorgio, conhecido nas redondezas como Italiano, faz sua caminhada matinal. Caminha poucas dezenas de metros, 30, 40, 50, com dificuldade, até a esquina com a rua Cisplatina e volta para casa.

“Nos últimos tempos ele deu uma caída”, observa Olivio.

Dona Eunice, companheira de quase 40 anos de Giorgio, acena e chama ao portão. É uma mineira de Belo Horizonte, 68 anos de vida. “A memória dele não está boa, pode ser Alzheimer, mas também pode não ser. Agora minha tarefa é cuidar desse meninão 48 horas por dia”, sorri.

Giorgio, para ela, é Paixão. “Paixão, venha ver quem veio te visitar…”. A voz firme e grave com o acento mineiro que não sai da gente.

“Cazzo in culo no fa figliolo…” Quem me disse isso pela primeira vez, eu menino, foi meu avô Silvio Minerato, filho de italianos, o Chicho ou o Nonno, como o chamávamos. Com a mesma calva proeminente, a mesma irreverência, a mesma alegria gaiata, os olhos verdes.

Dividimos o quarto, durante convalescenças dele por causa de infarto, derrame e outros males de má circulação que o acometeram durante a vida, por muitos meses. Era um festival de traques à noite, de ambos os furos, naquele nosso quarto.

No café da manhã, ele fazia omeletes e bolinhos (de espinafre, palmito e couve-flor) como ninguém. Costumava brincar que era o “cocinero do Conte Grande”, o famoso navio transatlântico italiano de passageiros, que atracava no porto de Santos (SP) sempre trazendo turistas célebres internacionais.

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), foi apreendido em Santos por tropas aliadas que lutavam contra Hitler e Mussolini.
Provavelmente por lembrar tanto o meu avô que logo simpatizei com o Giorgio. Bom assinalar que o Ipiranga tenha tanta coisa familiar e por isso faça tanto bem para mim.

 

 

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