Os olhos verdes de Dona Francisca, 82

Os olhos verdes de Dona Francisca, 82

Seus grandes olhos de hortaliça são pura clorofila. “Olha que olhos, que olhos! é um anjo! é um anjo!”, elogia seguidamente o poeta Dênis, da feira-livre de quinta-feira, na Mário Vicente, violão a tiracolo.
A feira tem este poder: de trazer novamente à rua, de tirar de casa gente que se acostumou a aparecer muito pouco, sobretudo os mais velhos, parte devido à saúde frágil, parte devido ao temor adquirido durante a pandemia.
A dona desse lindo par de olhos verdes é Dona Francisca. São 82 anos desses olhos iluminando o mundo. Ela vem vindo ali pelo meio da rua (perigo na calçada!), bengala hospitalar na mão direita, ‘vagarzinho. O motorista do táxi aguarda parcialmente o cortejo da Dona Francisca.
Esses olhos verdes vivem ali num pedaço de chão próximo à Salvador Simões, junto da filha e da neta. Viúva há muita vida.
Ajudando a ditar o ritmo do seu passo, o marca-passo no centro do peito. Teve ainda uma cirurgia importante no pulmão.“Já não consigo fazer muita coisa em casa por causa da saúde”, resigna-se.
Mas a ida à feira a saúde que claudica não impede.
E assim ela vai indo no seu ritmo, sutilmente, atrás dos hortifrútis com que a família vai se prover.
E a gente, que ama muito tudo isso, fica só observando, só admirando mais uma sobrevivente, mais uma resistente do Ipiranga Antigo.
Quando a luz dos olhos teus…, os lábios cantarolam baixinho.

 

RELACIONADAS

Pense numa mulher bacana. É a Yolanda!