Audiência bota pressão no poder público por Usina Eco-Cultural

Audiência bota pressão no poder público por Usina Eco-Cultural

Gente, a proposta de criação do museu do meio ambiente (um centro ambiental e cultural) nas instalações do antigo Incinerador Vergueiro deu mais um passo formal à frente.

Foi no último sábado (12), com a realização da audiência pública para tratar da proposta do movimento civil Usina Eco-Cultural, que reuniu cerca de 250 pessoas, em sua maioria moradores e representantes de entidades sociais que atuam no Ipiranga. Todos a favor da conversão do espaço em polo ambiental e cultural.

Foi, em síntese, uma manifestação pública que botou pressão sobre o poder público municipal, que tem resistido à proposta. A propósito, não houve presença física de nenhum representante do Executivo paulistano, sob o comando, hoje, do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

A audiência pública, convocada pela Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente por iniciativa da vereadora Sílvia Ferraro (PSOL), foi realizada na escola estadual vizinha ao ex-incinerador, a Coronel Raul Humaitá Villa Nova.

A abertura coube à vereadora Sílvia, que frisou a importância da realização de audiências públicas como momento de a população se expressar e ser ouvida. Sobre o debate em questão, Sílvia chamou a atenção para a importância da conservação da memória do local. O incinerador entrou em atividade em 1968 e teve seu forno apagado em 2002, ficando abandonado desde então.

Representando o movimento Usina Eco-Cultural, a arquiteta Débora Machado fez uma retrospectiva da mobilização e do próprio ex-incinerador. Lembrou da luta travada no passado, nos anos 90, para a suspensão da queima do lixo hospitalar no local, da poluição despejada na população do entorno e dos problemas de saúde advindos da atividade de queima do lixo.

Débora lembrou então do início do movimento, em 2019, que começou a pensar em qual poderia ser o destino do ex-incinerador, haja vista que estava abandonado.

Faixa na audiência se posiciona contra volta de incineradores

Para cumprir seu papel social

“A gente entende que o prédio abandonado não cumpre seu papel social”, ponderou. A líder da usina descreveu, então, a mobilização do ano de 2022, com a ocupação pela comunidade das instalações do antigo incinerador e a realização de dezenas de atividades educacionais e ambientais no local, sempre abertos à população.

“Nossa proposta é muito clara: que o edifício se torne um museu do meio ambiente e que toda a área do entorno seja um polo cultural com atividades de esporte e bem-estar, se tornando um ponto de encontro da cidade”, disse ela.

A também arquiteta Susie Luna, falando em nome do Cades Ipiranga (o conselho regional de meio ambiente e desenvolvimento sustentável), aproximou os objetivos da Usina Eco-Cultural dos 17 ODSs (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU.

Susie citou nove objetivos comuns, como o de fome zero e agricultura sustentável (ODS 2;) água potável e saneamento (ODS 6); e ação contra a mudança global do clima (ODS 13). O projeto da usina prevê o cultivo de horta orgânica; a descontaminação do solo (hoje afetado quimicamente em nível ignorado); e a prática da educação ambiental em termos de conscientização sobre o clima.

Atividade do movimento Usina Eco-Cultural no interior da área do antigo Incinerador Vergueiro

O professor Casé Oliveira, representante da entidade Missão Ambiental.org, destacou seu papel de mediação de conflitos entre o poder regional, representado pela Subprefeitura Ipiranga, e as lideranças do movimento da usina.

Casé leu uma breve declaração enviada pelo subprefeito do Ipiranga, Adinilson Almeida, que justificou sua ausência por um “imprevisto”. Segundo Casé, Almeida se disse a favor dos debates e que respeitará o que for decidido pela maioria da população.

O professor também sublinhou o apoio de sua entidade ao pleito do polo ambiental e cultural. “Somos a favor da utilização do espaço, somos a favor de o movimento voltar para a usina (isso é muito importante para que o movimento se consolide) e também somos a favor da transformação do espaço ali em museu do meio ambiente”, finalizou.

Ameaçado e multado em R$ 42 mil pela Subprefeitura Ipiranga em maio passado, o movimento foi obrigado a deixar o pátio do ex-incinerador.

Federação de Skate também reivindica área

Novidade apresentada na audiência foi a ação protocolada pela Federação Paulista de Skate, na última sexta-feira (11), pleiteando o uso do espaço do ex-incinerador, de forma complementar ao movimento da usina.

O anúncio foi feito ao microfone por Bruno Rinaldi, representante da federação e liderança do skate no Ipiranga. Os skatistas também ocupariam o espaço para a prática esportiva, a exemplo do que já fizeram em outras áreas degradadas (e em recuperação) da cidade, como o Anhangabaú, lembrou Bruno.

“A usina é nossa”: atividades reuniram pais e filhos no ex-incinerador

Outras falas

A arquiteta e urbanista Karina Saccomanno participou do encontro e ressaltou a contribuição que a transformação de espaços abandonados em equipamentos públicos de lazer, como agora o caso do projeto para o antigo incinerador, pode trazer para a cidade.

“A gente precisa de uma cidade com mais afeto. Daí a necessidade de os bairros terem espaços de preservação e isso tem que ser escolhido pela própria comunidade. Esse lugar do afeto quem dita são as pessoas que moram na cidade”, defendeu a arquiteta.

A professora Celina dos Anjos morou na região em dois momentos: quando criança, de 1975 a 1987, e depois, já adulta, voltou para a área em 2015, onde vive até hoje.

Na infância, o medo era em relação à saúde por causa da fumaça tóxica emitida pelo incinerador, que funcionava na época. Hoje, o medo é da violência por causa do abandono do prédio.

“A região do entorno do prédio do incinerador é escura, não tem iluminação e, principalmente à noite, não tem ocupação, fluxo de pessoas, o que nos deixa apreensivos. Tendo um centro cultural ali, a situação é bem diferente, melhora para todo mundo, valoriza ainda mais o bairro”, ressaltou Celina.

Ao encerramento da audiência, que durou mais de duas horas e meia, a vereadora Sílvia Ferraro se disse satisfeita com o discutido, mas ressaltou que foi apenas o início deste debate sobre a Usina Eco-Cultural.

“Essa discussão não termina aqui, porque agora nós precisamos que o Poder Executivo se sensibilize. Não é possível que, diante de tantas demonstrações de apoio ao projeto, por parte da população desta região, ele continue fingindo que não tem nada a ver com isso. É preciso acatar o que a maioria quer, isso é democracia”, frisou Silvia.

Também compôs a mesa dos trabalhos Décio Oda, que representou o vereador Aurélio Nomura (PSDB), também a favor da Usina Eco-Cultural.

 

“A gente não quer passar por ali só para ir ao metrô, a gente quer usar o espaço”, Flávio Ferreira, morador do Ipiranga, durante audiência

 

Fotos: Movimento Usina Eco-Cultural e Ipiranga22